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As consequências dos cinco anos da Lei Seca

Por Portal do Trânsito 01/07/2013 09h09
Foto: Foto ilustração
Neste mês de junho a Lei Seca completa cinco anos de vigência. A Lei 11.705/2008 foi recebida com otimismo pelas autoridades e alardeada pela imprensa com grande empolgação, pois tinha como principal “missão” ser a grande responsável pela queda do número de mortes no trânsito.

A Lei Seca trouxe alterações tanto para o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) quanto para a Lei 9.294/96, que dispõe sobre “as restrições ao uso e à propaganda de produto fumígeros, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas”. No tocante às alterações então promovidas no CTB, a Lei 11.705/2008, logo em seu artigo 1º, já deixava claro que duas, basicamente, eram as suas finalidades, quais sejam, “estabelecer alcoolemia 0 (zero) e impor penalidades mais severas para o condutor que digirir sob a influência do álcool”.

É bom que se diga que a Lei Seca não “criou” crime algum, mas apenas alterou a redação do delito de “embriaguez ao volante”, que já existia em nosso sistema normativo desde 1997, ano em que entrou em vigor o atual CTB. De fato, o crime de embriaguez ao volante, até então tipificado como “conduzir veiculo automotor, na via pública, sob a influência de álcool ou substância de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem”, ganhou um novo elemento objetivo: determinada concentração de álcool por litro de sangue.

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Com a Lei Seca, a tipificação do crime previsto no artigo 306 do CTB ficou condicionada à apuração objetiva de que o condutor do veículo detinha, no mínimo, seis decigramas de álcool por litro de sangue. No caso específico do bafômetro, o parágrafo único, do artigo 306, do CTB, deixou claro que era preciso estabelecer uma regra de equivalência.

Coube ao Decreto 6488/2008 estabelecer que, nos casos de a aferição da embriaguez ao volante ser medida a partir de “teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro)”, a “concentração de álcool igual ou superior a três décimos de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões” seria suficiente para caracterizar o tipo penal.

Ocorre que, justamente em razão do acréscimo daquelas novas circunstâncias de caráter objetivo, a Lei 11.705/2008 passou a servir de meio para a impunidade. Isso porque, como consequência lógica do direito constitucional do acusado/investigado ao silêncio, surgiu o princípio de que “ninguém está obrigado a produzir prova conta si mesmo”.

Sendo assim, como, então, compelir alguém a efetuar o teste do bafômetro ou o exame de sangue? E foi justamente por conta disso que a Lei 11.705/2008 acabou representando um retrocesso. Bastava ao condutor se negar a realizar qualquer tipo de exame e, por mais embriagado que ele estivesse o crime não ficaria caracterizado.

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O Superior Tribunal de Justiça (STJ), pacificando a questão, decidiu que a partir da Lei 11.705/2008 o crime de embriaguez ao volante só poderia ser aferido e caracterizado a partir da realização de dois tipos de exame bem específicos, quais sejam, ou o exame de sangue ou o teste do bafômetro. Fica claro, então, que a Lei Seca, diferentemente do que se imaginava, trouxe mais problemas do que soluções. Quatro anos depois o Legislativo viu-se obrigado a editar uma nova lei (Lei Federal nº 12.760/2012) a respeito do tema, de forma a tornar mais rigorosa a apuração e a constatação da embriaguez ao volante.

Essa lei, que entrou em vigor no dia 20 de dezembro de 2012, inseriu importantes modificações no artigo 306 do CTB. Em primeiro lugar, o legislador tratou de “limpar” o caput, deixando-o com uma redação bem próxima daquela existente antes da Lei 11.705/2008, sem qualquer menção à concentração de álcool no sangue.

O legislador definiu que a constatação da embriaguez poderia se dar ou pela “concentração igual ou superior a seis decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar”, ou, então, por “sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração de capacidade psicomotora”.

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Já no parágrafo segundo, verdadeiramente ampliando os métodos de prova da embriaguez, ficou previsto que a “verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova”.

A Lei 12.760/2012 recebeu severas críticas ao permitir que a embriaguez pudesse ser constatada a partir de “vídeos, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos”. Deixou porta aberta para arbitrariedades e “achismos”, já que tanto policiais/agentes de trânsito quanto particulares não podem se equiparar a peritos para afirmar que alguém se encontra embriagado.

Críticas à parte, fica fácil perceber que, a partir da Lei 12.760/2012, a simples negativa do condutor em cooperar com a realização dos exames de sangue/bafômetro não é mais garantia da impunidade, haja vista que diversos outros elementos de prova poderão ser usados para comprovar a embriaguez. E o efeito dessa legislação mais rigorosa já pode ser percebido nas ruas: o brasileiro, paulatinamente, vem adquirindo uma nova cultura. Passados cinco anos desde a implementação da chamada “Lei Seca”, podemos concluir que a legislação vigente, embora ainda não seja perfeita, trouxe grandes melhorias à sociedade.