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Alagoano Márcio Canuto se aposenta da Globo aos 73 anos

Por Redação com Gazetaweb.com 20/07/2019 14h02 - Atualizado em 20/07/2019 17h05
Despedida de Márcio Canuto da Globo foi marcada pela emoção - Foto: Arquivo Pessoal
Seja como o "fiscal do povo" ou como "repórter oficial da galera" nas transmissões das principais festas brasileiras (futebol e carnaval), Márcio Canuto ocupa a área mais nobre da comunicação no Brasil. O alagoano de 73 anos completou 57 de jornalismo e decidiu se aposentar do dia a dia, mas adiantou que nunca deixará de ser jornalista.

Natural de Maceió, Canuto começou a trabalhar ainda na adolescência, quando ganhou de uma federação esportiva uma credencial que lhe permitia cobrir partidas de futebol. O motivo do agrado foi ele ser um curioso nato, que foi considerado pelos membros da federação uma espécie de sabe tudo, mesmo aos 16 anos.

"Eu sabia os nomes dos jogadores, sabia quem fazia o quê, sabia o que tinha acontecido primeiro do que todo mundo. E aquela credencial era tudo que eu sonhava, porque eu não pagava entrada e ainda podia ficar naquela pista, onde acontecia a fofocada entre jogadores e jornalistas", lembra.

Ali, entre o alambrado e o campo de futebol, Márcio acredita ter sido chamado pelo jornalismo, quando um profissional olhou para sua "cara de menino" e perguntou se ele também era jornalista.

"E eu menti. Eu respondi que sim. Mas naquele instante eu me incomodei tanto, mas tanto, que eu corri pra casa e fui escrever uma reportagem sobre aquela partida".

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De 1963 em diante o jovem repórter não parou mais. Atuou em diversos veículos alagoanos, como o Diário de Alagoas, Gazeta de Alagoas, JB Alagoas, Correio de Maceió e Jornal de Alagoas. Aos 18 anos ele já atuava como editor de jornalismo.

Além dos jornais, Canuto trabalhou como chefe de esportes nas rádios Difusora e Gazeta, além de ser diretor de jornalismo da TV Gazeta de Alagoas, onde comandou o programa Esporte 7 e acompanhou a evolução da televisão.

Ele também trabalhava como correspondente de veículos nacionais, como o paulistano JT e para a TV Globo, onde passou os últimos 21 anos, antes de anunciar a aposentadoria, na sexta-feira, 12 de julho.

Na TV Globo de São Paulo, como repórter do SPTV 1ª edição, Márcio Canuto fazia o que afirma amar mais: jornalismo para o povo e perto do povo. Ele intermediava as reivindicações dos moradores de São Paulo com o poder público e, apesar do teor sério das reportagens, nunca deixou de lado o bom humor e a irreverência, que fizeram dele um dos mais populares comunicadores da emissora.

"Quando eu saí de Alagoas, esse pedaço de paraíso, eu já tinha mais de 30 anos de Gazeta. Eu devo tudo a esse estado maravilhoso, aos companheiros, time de ouro, com os quais eu convivi. Eu aprendi tudo com os jornalistas daí, que eram o meus heróis. Eu era curioso, ficava observando, aprendendo", diz o maceioense, que conversou com a Gazetaweb sobre o atual momento do jornalismo e sobre o seu futuro "nem tão longe das telinhas".

Como você avalia sua carreira até aqui, passa um filme na cabeça?

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- Passa. E eu tenho muito orgulho de tudo que conquistei. Não tem como não se emocionar com essa trajetória extraordinária em que encontrei tanta gente boa. Foi uma sucessão de coisas curiosas. Aos 17 anos eu já estava no Diário de Alagoas, aos 18 eu já era editor. Eu fui de amador para profissional muito rápido, me apaixonei pela profissão e me formei fazendo. E nunca fui de ficar parado, de me contentar. E tem uma história interessante, a primeira reportagem na televisão que eu fiz na minha vida, a primeira, que foi o jogo do Brasil contra a Holanda, eu fui parar no Jornal Nacional.

E como foi a despedida da Rede Globo, como fica essa relação?


- Olhe, com todo respeito aos mais antigos, mas eu nunca vi uma redação parar como parou na minha despedida. A redação parou, inteira. E veio todo mundo me abraçar. Eu não consegui me segurar e me emocionei com esse carinho, com esse respeito. Eu sou um trabalhador de muita força, de muita coragem, e a Rede Globo soube reconhecer isso. E eu só tenho a agradecer a todos de lá, a cada um, que eu vou levar no meu coração. Eu já fui editor da Gazeta de Alagoas e guardei comigo uma frase que o Arnon de Mello dizia. "A Gazeta de hoje precisa ser melhor do que a de ontem. E a de amanhã precisa ser melhor que a de hoje". Essa ideia me acompanhou por toda essa trajetória.

O jornalismo já te decepcionou?

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- Não. O jornalismo nunca me decepcionou, nem eu me deixei decepcionar. Eu nem tive tempo para isso. Sempre fui de fazer, de ir, de acordar e ir trabalhar, com uma força que nem eu mesmo sei de onde eu tiro. Então eu não acredito que o jornalismo tenha me decepcionado em nenhum momento. E nem eu decepcionei o jornalismo.

Sem dúvida o futebol é uma das suas paixões, mas para qual time você torce?

- Eu vou dizer que sou São Domingos. São Domingos era um time fenomenal, formado por jogadores que não se deram bem nem no CRB nem no CSA. E os jogos eram sempre imprevisíveis, porque se o São Domingos jogava com o CRB, tanto podia ser 5 a 0 para o CRB, como podia ser 6 a 0 para o São Domingos. Era extraordinário. O time era mantido por empresários e em meio às crises acabou minguando.

Mas aí você vai dizer, mas para que time você torce? E eu vou lhe dizer que torço pelo Santa Cruz do Recife. Mas aí você vai dizer, mas Márcio, você é alagoano, mora em São Paulo, o que tem a ver? Meu pai quando saiu de Alagoas para estudar odontologia no Recife, porque não tinha em Alagoas, chegou a jogar pelo Santa Cruz. Naquela época você saia de casa e era assim "se vire". E o Santa Cruz pagava a pensão do meu pai e ajudava nas despesas do mês. Ele morava em uma pensão que era um fenômeno, pois lá moravam, ao mesmo tempo, o Chacrinha, ainda tocando bateria, e Ariano Suassuna. Então eu cresci vendo fotos dessa época, com os troféus que ele ganhou no Santa Cruz, ouvindo ele cantar, todos os dias, às sete da manhã, o hino do Santa Cruz. Eu posso não ter decorado hino nenhum, mas o do santa Cruz eu decorei.

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Você se vê como precursor desse jornalismo mais dinâmico e informal, principalmente nas transmissões esportivas?

- Eu diria que eu colaborei para essa cara que tem hoje a transmissão esportiva. De alguma maneira eu ajudei a abrir um caminho. Assim como abriram caminhos para mim antes de eu vir para São Paulo.

Você avalia que falta ao jornalismo chegar ainda mais perto das pessoas? Esse é o futuro do jornalismo?

- Eu venho defendendo isso desde o começo da minha carreira. Eu acredito que o jornalismo será feito, cada vez mais, por quem quer estar perto do povo, por quem quer falar do que está próximo das pessoas. Você quer saber o que acontece na sua rua, no seu bairro, na sua cidade. E isso é mais importante para você - para você, não para o mundo - do que o que está acontecendo em qualquer outro lugar do mundo. Claro que você tem que se informar, mas é preciso compreender isso. Você quer saber da sua rua, do seu trânsito, de um acidente. Quer saber mais sobre a situação do Pinheiro, do que sobre um terremoto que aconteceu em Medellín. Quando eu comecei, sabia que era preciso ir para o meio do povo. E eu sou assim até hoje, igual ao que me veem na TV, sou nordestino, falo alto mesmo, sou expansivo, gosto do povo, gosto da folia, de estar no meio das pessoas. Eu sempre fiz deste meu trabalho uma diversão. E quando eu vejo que conseguimos ajudar a mudar a vida das pessoas, é uma satisfação sem igual. E eu gosto de povo, não sou político, não sou nada disso, só gosto de gente, sou assim.

Ao se aposentar, você deixa de ser jornalista?


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- Eu não vou parar. Eu estou dando um tempo. Estou me aposentando do dia a dia, porque não é fácil passar tantos anos acordando 5h da manhã. Eu estou com 57 anos de profissão e 73 de idade, muitas vezes trabalhando a semana inteira e ainda no domingo porque tinha jogo. E não deixo de ser jornalista, não deixo jamais. E não vou parar porque a natureza não me deixa. Eu vou me reinventar. Vou fazer outra coisa, vou descobrir outros caminhos, vou na publicidade, vou transitar nas áreas.

Qual sua relação com Alagoas?


- É de paixão. Eu saí de Alagoas, mas Alagoas nunca saiu, nem sairá, do meu coração. Eu devo muito ao meu Estado, à Gazeta de Alagoas, eu tive oportunidades e sempre falo para todo mundo visitar Alagoas. Para encontrar esse povo maravilhoso, esse lugar lindo. E muita gente já foi e entendeu essa minha paixão. Eu falo de Maceió o tempo todo, minha família está aí. Eu me emociono em falar sobre essa terra querida, que enquanto eu viver estará no meu coração.