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Justiça do RS anula condenação por incêndio na boate Kiss; 4 serão soltos

Por redação com UOL 03/08/2022 20h08
Kiko Spohr, Mauro Hoffmann, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Bonilha Leão durante o júri da boate Kiss - Foto: Reprodução/TJ-RS

O TJ-RS (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul) decidiu hoje anular o julgamento dos quatro condenados pelo incêndio na boate Kiss, que matou 242 pessoas e deixou outras 636 feridas em 2013. Em dezembro de 2021, os quatro haviam sido condenados pelo Tribunal do Júri, em julgamento que durou dez dias. Todos serão soltos.

A decisão foi tomada na tarde desta quarta-feira pela 1ª Câmara Criminal, em Porto Alegre. Foram dois votos a favor da anulação e um contrário. Com a decisão, que cabe recurso, um novo júri deve ser marcado.

O Ministério Público criticou a anulação e diz que vai recorrer. "Através de recursos, tanto ao STJ, como ao STF, nós buscaremos a reversão dessa decisão e do reestabelecimento da justiça", afirmou Júlio César de Melo, subprocurador-geral de Justiça para assuntos institucionais do MP-RS.

Após a condenação, a defesa dos quatro condenados ingressou com apelações na Justiça, alegando nulidades no processo e durante o julgamento. Um dos pontos questionados pelos advogados foi a sentença por dolo eventual, ou seja, quando, mesmo sem desejar o resultado, se assume o risco de matar.

Na época do julgamento, foram sentenciados por dolo eventual os dois sócios da boate —Elissandro Callegaro Spohr, conhecido por Kiko, e Mauro Londero Hoffmann— e dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira —o produtor Luciano Bonilha Leão e o vocalista, Marcelo de Jesus dos Santos.

Hoje, o advogado de Spohr, Jader Marques, disse que a sentença por dolo eventual "deveria anular o julgamento". Já Jean Severo, que defende Luciano Bonilha, observou que até "um acadêmico" ou um estudante "que cabula aula" saberia que a sentença não poderia ser por dolo eventual.

Os advogados pediram a anulação do julgamento devido a escolha dos jurados, selecionados após três sorteios, por manifestações da plateia durante o julgamento e pela conduta do juiz Orlando Faccini Neto considerada por eles como "parcial", entre outros motivos.

Na análise, o desembargador Manuel José Martinez Lucas, relator dos recursos e presidente da sessão, observou que foram apresentados pelos advogados 19 pedidos de nulidade. Porém, todos foram desconsiderados pelo magistrado.

Martinez salientou que, apesar de alguns pontos pudessem resultar na nulidade do julgamento, é preciso que o processo tenha um fim. "As famílias esperam uma resposta e os próprios réus", disse.

O desembargador destacou o risco de outros júris serem anulados, caso se decidisse fazer o mesmo no da Kiss.

Já o desembargador José Conrado Kurtz de Souza se manifestou favorável a algumas nulidades, como sobre o sorteio dos jurados e de uma conversa em privado do magistrado com as defesas - sem a presença do Ministério Público. Já nos outros pontos acompanhou o relator.

Último a se manifestar, o desembargador Jayme Weingartner Neto votou para anular o Tribunal do Júri e realizar um novo julgamento. Uma das justificativas está relacionada à "paridade de armas", que é a igualdade no tratamento das partes do processo. Segundo o magistrado, houve desequilíbrio na atuação do Ministério Público em relação aos advogados de defesa.

Além disso, Weingartner Neto observou que regras foram descumpridas na escolha dos jurados e que os "atos praticados foram atípicos".

"Foram descumpridas no sorteio de número excessivo de jurados, e foram descumpridas na realização de três sorteios, sendo o último flagrantemente fora do prazo legal (24/11/2021), a menos de dez dias úteis da data da instalação da sessão (1º/12/2021)", disse o desembargador.

Antes dele, Conrado já havia salientado que a lei não tinha sido seguida neste quesito. "É preciso zelar para que todos julgamentos, complexos ou não, obedeçam à lei. Não há dois Códigos de Processo Penal. O sorteio de 25 jurados é o ponto fulcral da questão", disse.

Réus foram condenados de 18 a 22 anos de prisão

As penas foram lidas pelo juiz Orlando Faccini Neto, que considerou "elevada a culpabilidade dos réus".

As penas foram definidas assim:

Elissandro Spohr - 22 anos e seis meses de prisão

Mauro Hoffmann - 19 anos e seis meses de prisão

Luciano Bonilha - 18 anos de prisão

Marcelo de Jesus - 18 anos de prisão

O julgamento ocorreu em Porto Alegre, a 289 km de distância de Santa Maria, onde ocorreu a tragédia.